Gostaria
de ser um ourives das palavras, como li no livro Trem noturno para Lisboa. E é por isso que hoje gosto mais de
escrever sobre filosofia e assuntos que permitem uma reflexão interior e um
aprofundamento sobre o espírito humano do que simplesmente sobre segurança
pública.
Não
que não escreva sobre segurança pública ou que isso não tenha relação com ela,
pois isso também a toca, mas é muito mais do que já foi um dia, é muito mais
complexo e promissor do que dicas pontuais sobre como não ser vítima de
criminosos. Sou grato por ter escrito sobre criminologia, dicas de segurança,
qual a melhor forma de punição, qual a melhor política criminal. Ainda
escreverei sobre isso neste espaço, quando tratar da 2ª grande área da
segurança pública, mas atualmente tenho que tratar um pouco mais da 1ª grande
área, da única transformação real e possível.
Temas
sobre o que entendemos tradicionalmente como segurança pública são importantes,
mas transformam-se em algo pequeno, transitório e terreno quando os comparamos
com alguns temas que podemos abordar na filosofia. Talvez minha religião seja
essa fé inconcebível de que, quando as pessoas se aprofundarem no interior de
suas almas, a sociedade e a segurança pública estarão resolvidas. Quem sabe seja
esta fé incongruente que me faça escolher isso e não o que já fui um dia.
Sou
grato por tudo que a segurança pública me forneceu para escrever, mas hoje
escrevo para ensimesmar-me, para ser um ourives do espírito, para entender a
essência da alma humana. Acredito mais nisso do que em polícia.
Entretanto,
isso não tem nada a ver com meu trabalho diário, com minha profissão de
Delegado de Polícia, com meu dia a dia. Digo que não tem nada a ver, ainda que
tenha em alguma escolha, em alguma forma de atuação, em algum tom mais singelo,
por toda essa busca não me impedir de combater diretamente o crime e atuar de forma
dura quando assim a situação exige.
Lá,
apesar de entender a tragédia humana que envolve o crime e o delinquente,
apesar de compreender algumas vezes os criminosos e suas razões, tenho o firme
propósito de não ser vítima e não permitir que pessoas inocentes sofram diante
do crime, seja qual for o motivo para que ele ocorra ou para que alguém o
cometa. Posso entender um criminoso, e até lamentar a vida desgraçada que o
levou até ali, mas não serei sua vítima jamais.
Isso
não resolve nada, mas nos faz sobreviver. É para sobreviver que trabalho, mas é
para resolver que escrevo.